Ainda me sinto ameaçado pela
possibilidade de me entregar a você. O meu “não” em realção a você ainda não
tem a firmeza necessária para ser definitivo. Tudo que consigo fazer é me
afastar. Manter uma distância suficiente para não ser pego de surpresa por
você, numa dessas esquinas.
Sou muito racionalista, é
verdade. Mas a reflexão não é um fim em si mesma. Ela traz consigo as verdades
resultantes do exercício de ponderar, avaliar, pensar sobre o assunto, etc. Sei
que não deveria me arriscar, principalmente porque já o fiz outras vezes. Não deu
certo. Ou deu “outro certo”, diferente do que eu esperava. Mas me traio
pensando em você, desejando tanta coisa.
Procuro explicações para esse
paradoxo. O querer do saber em detrimento do querer em si. O corpo físico, tão
carente de argumentos, lutando contra todos os argumentos da Razão. Sou o resultado
dessa dualidade conflitante, às vezes me divido em dois. E fica muito difícil
administrar. Não há acordo.
A aceitação de um lado significa
a recusa do outro. E para uma personalidade racionalista como a minha, fica
muito difícil entrar num acordo, sabendo mais sobre perdas do que ganhos.
Aliás, sabendo exatamente quais as perdas. Sempre que tomo um dos lados, me
encho de coragem e medo na mesma medida. O alívio e a falta daquilo que abri
mão. Deixo sempre um pedaço de mim, sempre na tentativa de me salvar. O que não
me faltam são argumentos. O que me falta é coragem.
Fico pensando sobre o que é você
mesmo ou o que eu vejo. Talvez o que eu tento tanto ver em você nem exista.
Talvez nunca lhe ocorrido a ideia de ser o que eu acho que vejo em você. Talvez
seja esse o grande dilema: eu devo ter visto em você algum potencial para ser
quem eu gostaria. Nesse caso, eu devo ter tentado te pintar com as nuances
desse meu arquétipo. Colocar aquilo que lhe falta, para me ser um par.
Talvez, do lado de lá, aconteça
coisa bem parecida: você deve ter abordado o assunto da mesma maneira, já que
sempre acaba querendo voltar, mesmo sabendo dos desacertos do passado. Acho que
também vê em mim algum potencial para ocupar um lugar, já desenhado, com apenas
alguns ajustes. Será que há remédio pra isso? Talvez não. Aqui são dois lados,
procurando metades, mas com encaixes bem definidos. Não parece haver tempo e
espaço para esses ajustes. São cargas energéticas que se repelem, mesmo com
grande desejo de se fundirem.
Sigo adiante racionalizando tudo
isso dentro de mim. Penso e repenso; encho-me de argumentos para me manter
firme na decisão que tomei. Faço isso com maestria impecável, recebo até
elogios pela minha firmeza de decisão. Mas ando pela vida na iminência de ser
pego de surpresa, em qualquer esquina e sentir as pernas tremerem, ficando sem
forças. O bote pode ser fatal. “Pode até parecer fraqueza, pois que seja.... o
que eu ganho e o que perco, só eu sei....”